Desde muito pequenas sonhamos com as histórias de princesas, seus belos vestidos, castelos, queremos também poder usar uma coroa brilhante. Quando crescemos, muitas de nós (eu me incluo nestas) continuamos fascinadas pela monarquia, sua história, tradição, suas joias tão fabulosas. Ainda que você não esteja neste grupo, garanto que por uma fofoca real você se interessa: assistiu a cobertura dos casamentos reais, The Crown, está a par das comparações e rivalidades lançadas entre Meghan Markle e nossa Princesa Kate. Mas, estejam certas, nenhuma fofoca sobre a realeza que você já ouviu poderá chegar perto da inacreditável história do colar de Maria Antonieta. Vamos lá?
Sabe quando a vida imita a arte? Pois aqui a vida superou a imaginação do roteirista mais criativo e inspirado. Se fosse um filme, você poderia parar na metade pensando “está inverossímil demais, melhor ter se atido aos fatos reais”. Essa história é, sem sombra de dúvidas, uma das farsas mais absurdas e inacreditáveis que você já ouviu. Exagero? Acredito que não. Mas leia e julgue por você mesma.
Nossa história se passa nos anos de 1780s, e começa com uma menina largada, suja, pedinte, maltrapilha, que vivia nas ruas mendigando e procurando algo para ter o que comer. Seu nome era Jeanne. Era filha de homem falido e de uma prostituta. Certa vez, num de seus dias de mendicância, ela pede ajuda para uma rica e nobre mulher, uma marquesa, que passava por ela em sua carruagem: "por favor, uma esmola para uma menina pobre da casa de Valois".
Impossível! Aquela menina esfarrapada é da linhagem de Valois? Corre em suas veias nada menos que o mesmo sangue de diversos reis da França?! Sim, seu pai, apesar de nobre arruinado, era descendente direto de uma das dinastias mais importantes da história da França, tanto quanto a dos Bourbon. A marquesa, impressionada, decide acolher a pobre menina e criá-la de maneira mais digna.
Jeanne cresce em um ambiente mais salubre e, ainda jovem, é mandada para um convento. De lá ela foge para se casar com um rapaz da baixa nobreza. Agora Jeanne se torna Madame Jeanne de la Motte. Em comparação à vida miserável que já havia levado, sua condição agora poderia proporcionar a ela uma vida tranquila e digna, se ela fosse uma menina mais equilibrada. Se ela fosse, mas não era. É como se o sangue da realeza estivesse preso dentro do corpo de uma mendiga. Ele clama por ascensão social e financeira a todo custo, nada iria pará-la até que ela estivesse onde deveria estar por direito.
A ardilosa (e socialmente insaciável) Jeanne e seu marido logo começam a aplicar todo tipo de golpe e falcatruas e para conseguirem seus dois objetivos: dinheiro e ascensão social. Querem passar a impressão de serem o que não são, de terem o que não têm, de participarem do que não participam. Tudo o que é falso dura pouco, e depois de algum tempo enganando as pessoas, a realidade - essa grande estraga prazeres -, sempre teima em aparecer. Não, uma Valois não pode se contentar com pequenas tramoias e engodos, ela precisa de um verdadeiro golpe, o derradeiro e de grandes proporções.
Entra aqui na nossa história outro personagem importante: Louis, o Cardeal de Rohan. Grão esmoleiro, membro de uma família influente, membro da academia francesa. Ele tem trânsito com a nobreza e alta sociedade francesa e quer ser o primeiro ministro da França. Ocorre que ele tem um grande obstáculo para isso. Maria Antonieta tem aversão a ele, desafeto de sua família, desde muito nova. Se o Cardeal precisava de ajuda, ele a achará em Jeanne. Ela o conhece e o convence que é íntima de Maria Antonieta (com Valois no nome, não seria absurdo). Jeanne diz que vai interceder por Rohan. Então, começa o jogo de engodos e manipulações, no qual Jeanne é profissional.
Certa vez, Jeanne diz que Maria Antonieta vai dar ao Cardeal um aceno de cabeça discreto, numa de suas visitas a Versalhes. Ele acredita. Noutra, ela fabrica cartas fingindo que Rainha estaria se correspondendo com ela, com falsificações e tudo mais. E vai ainda mais longe. Convence o cardeal a escrever cartas à Maria Antonieta com a promessa de que Jeanne mesmo seria a intermediária entre os dois (sempre trazendo de volta uma carta fabricada por ela mesma como resposta).
O cardeal está nas nuvens: de alguém ignorado e rejeitado, ele passa a ser um correspondente confiável. Quando se quer acreditar em algo de verdade, fica mais fácil, não é mesmo? Ainda assim era estranho que, pessoalmente, a Rainha o ignorasse categoricamente, como sempre o fez, enquanto nas cartas ela se mostrava muito mais receptiva, ainda que sempre pedindo discrição. Agora era a hora de avançar a farsa ainda mais para convencer o Cardeal. Por que não, vejam só, realizar um encontro, entre o cardeal e a Rainha?!
Talvez esta seja a parte mais absurda da nossa história. Acreditem ou não, isso aconteceu de verdade. O casal embusteiro cria um ardil fascinante, precisamos admitir. Eles vão às ruas famosas pela prostituição em Paris e conseguem achar uma menina muito parecida com a Rainha, que se chamava Nicole D'Oliva. Jeanne a veste pessoalmente com um vestido idêntico ao da famosa pintura de Elisabeth Vigée le Brun, encontram também um chapéu que esconde o seu rosto, e marcam como lugar de encontro uma parte escura no jardim de Versalhes, à noite, obviamente. Por alguns minutos, a prostituta/atriz vai se passar por Maria Antonieta na presença do cardeal. Será que um plano tão delirante vai funcionar?
Continua…